terça-feira, junho 22, 2010

UMBAOBÄ



Baobá, que tesouros guardas em teu ventre?
Dizem que guardas segredos em teu tronco.
E de tão gordo convidas que eu entre.

Meu vô foi criado à tua sombra.
Tu já eras grande e imponente.
Tua origem é tão antiga que ninguém lembra.

Nasceste de cabeça para baixo.
Como a nos dizer: Há algo errado na África!
A escravidão já acabou, eu acho!

Mas tu ainda vês muita miséria.
Muita fome e guerra.
É a coisa ta mesmo séria!

Quanto te vejo ai sozinho.
Quase entendo o que dizes.
Assim calado e tristonho.

Neste tronco-peito tens um segredo.
É ai que guardas o coração da África.
Grande,Lindo e amado

quinta-feira, junho 17, 2010

Identidades - Parte II



Muitos de meus alunos não tinham feito a sua carteira de identidade ainda. Eles estão estudando sobre suas identidades, suas origens, suas peculiaridades, suas qualidades e aprendendo a ter orgulho de quem são. Não um orgulho egoísta e vaidoso, mas um orgulho construtivo e valorizante. A identidade para estas crianças tem um valor muito mais simbólico do que prático. Não serão cobradas por não a possuírem, não perderam seus direitos assegurados com suas certidões de nascimento. Estas eles já estudaram, sabem quem são seus avôs, seus pais, seus padrinhos, onde e quando nasceram. A carteira é uma recordação, um comprovante para dizerem quem são. É o concreto, o palpável daquilo que lhes representa. Fiz um esforço para conseguir com que todos tivessem a oportunidade de confeccionar suas carteiras. Após algum malabarismo consegui agendar junto ao Departamento de Identificação (Porto Alegre) para todos poderem fazer no mesmo dia. Faltava o transporte, desta vez nem com prestidigitação foi possível conseguir um ônibus de graça, lamentavelmente nossos velhos colaboradores não puderam nos prestar esse favor. O jeito foi fretar um ônibus a ser pago pelos alunos. Nem todos fizeram parte desta atividade, muitos já há possuíam, outros simplesmente não tiveram interesse de fazer agora: é muito cedo, pensaram alguns pais. Outros infelizmente, talvez por não puderem pagar o transporte, não se manifestaram.
O grupo saiu faceiro. Empolgados sim, mas ordeiros. Foram disponibilizados quatro guichês para meus alunos puderem confeccionar as carteiras. Sempre que aparecia uma senhora grávida ou um idoso eles gentilmente sediam sua vez. Foram indo aos poucos e quando faltavam três alunos a fila dos outros guichês havia aumentado e optamos por compartilhar a fila comum para evitarmos maiores transtornos retribuindo a gentileza que o pessoal do Instituto Geral nos fez. Tiramos fotos de lembranças e agradecemos a acolhida. Meus alunos deram uma aula de civilidade e cidadania, me enchendo do mesmo orgulho que gostaria que eles tivessem de ser quem são.

quarta-feira, junho 16, 2010

Identidade - Parte I


É este pedaço de papel que vai dizer quem somos?
Somos negros, somos índios, somos brancos.
Os rios da África correm em nossas veias.
Nossas raízes nutrem-se das terras roubadas dos Guaranis.
Nossas lembranças perdem-se no além mar.
Quais são nossas identidades?
Somos brasileiros.
Somos gaúchos de coração.
Torcemos por nosso time ganhar o Grenal.
Acendemos uma vela na igreja.
Damos pinga pro santo.
Pedimos a benção de Tupã.
Nossa mesa é farta.
Comemos feijoada, vatapá, aipim e bacalhoada.
Cerveja no verão, vinho no frio.
Chimarrão sempre.
E um cafezinho pras visitas.
Quem nós somos?
Na carteira vai meu nome.
Nossa identidade é única.
Nossa cultura é vasta.
Temos uma rica herança.
Temos orgulho de nossa terra.
E por ela havemos de lutar, tal quais os farrapos.
Sabemos de onde viemos
E pra onde queremos ir.
Escreve ai seu moço.
Somos brasileiros
Somos gaúchos.
Temos um nome.
Coloca ai que eu assino em baixo.

segunda-feira, junho 14, 2010

Novos assuntos velhos

Nesta semana meus alunos receberam pequenos mapas onde puderam identificar onde ficavam suas casas. Depois marcamos em um grande mapa onde morava cada um deles. A curiosidade dos alunos chamou a atenção de que no mapa só estavam identificadas duas escolas e segundo eles havia uma terceira. Eu também conhecia a tal escola, mas não sabia seu endereço, resolvemos investigar e registramos este ponto no mapa. A partir de então todos puderam contribuir com outros pontos de referência que achavam importantes. Na construção de suas identidades puderam observar melhor o entorno de suas casas e como localizarem-se. Um dos meus alunos mora ao lado de um “valão” estivemos neste local no começo do ano. Estudamos o efeito da poluição nas fontes de água. Foi uma atividade bem interessante, pois na continuação estivemos no DMAE onde pudemos ver a trabalheira que dava limpar toda aquela sujeira que pudemos ver in locuo. Esta atividade foi uma semana antes de começar meu estágio, e agora nestes últimos dias trabalhei a questão do bullying em nossa escola.
Mas porque trabalhar questões "da moda"? Não seria um pouco de redundância tratar de questões que eles vêem na mídia no seu dia a dia? Creio que não, quando vêem tais assuntos na tela da TV, muitas vezes não se dão conta do impacto que eles tem no seu dia a dia. Tratar de sustentabilidade, da preservação das espécies, da conservação do planeta não se trata de uma moda passageira, trata-se de nossa sobrevivência. Conversar sobre o bullying, que todos sabem não ser nenhuma novidade que surgiu ontem, não é trocar o nome de velhos problemas e sim procurar novas soluções e se conseguirmos extingui-los, pelo menos amenizá-los. Não pretendo fazer um diálogo vazio, politicamente correto ou sensacionalista, mas sim construir uma consciência coletiva, o mais abrangente possível, dos problemas que afetam sim a mim e meus alunos.
Antigamente se ensinava sobre os problemas de poluir os rios, tiravam do contexto e queriam que nos alunos abstraíssemos tal conceito e compreendêssemos todo o processo sem mal sabermos o que é um rio. Não é preciso levar nossos alunos a nenhum valão, basta levá-los a um bueiro e perguntarmos aonde vai toda a sujeira que ali depositamos e fazê-los compreender que mesmo isolados fazemos parte de um todo. Não é preciso perguntar se souberam ou se viram algum caso de violência em escolas exibido na mídia. Basta perguntar o que viram durante o recreio e que não gostariam que tivessem feito com eles. Ninguém gosta de ser chamado de gordo, ou de magro, de feio ou de burro. Para alguns isso dói mais que muito tapa na cara.
Tratar de problemas que afetam nossa sociedade não é modismo, e expor algo que não pode ser mais escondido. É tirar a venda da ignorância para quem sabe um dia estes sejam problemas a serem estudados apenas pela história.

domingo, junho 13, 2010

Ensinar exige respeito à autonomia do ser educando


O titulo não é meu, é do mesmo livro do Paulo Freire, Pedagogia da Autonomia, com o qual já trabalhei na postagem anterior. Ao ler este capítulo lembrei de um texto que conheci pelo nome de “o menino e a flor”, que hoje descobri ser “o menino pintor”, escrito por Púllias e Young Earl. Nele vemos bem o quanto podemos prejudicar a criatividade e autonomia de uma criança impondo nossos próprios valores e ”pré-conhecimentos”. Respeitar a autonomia do educando (educando pois se aplica a alunos de todas as idades, mas principalmente quando ainda não tem uma identidade plenamente desenvolvida) como nos faz ver Freire, requer um capitulo a parte:



“Não faz mal repetir afirmação várias vezes feita neste texto - o inacabamento de que nos tornamos conscientes nos fez seres éticos. O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros. (...) . O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que minimiza, que manda que "ele se ponha em seu lugar" ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se exige do cumprimento de seu dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa existência. É neste sentido que o professor
autoritário, que por isso mesmo afoga a liberdade do educando, amesquinhando o seu
direito de estar sendo curioso e inquieto. Tanto quanto o professor licencioso rompe
com a radicalidade do ser humano...

Deixemos portanto os alunos pintarem flores de todas as cores, de todas as formas, mas sem "pintar o sete", respeitando suas individualidades e suas ideias. O conhecimento, como o próprio ser humano, é inacabado, está em constante processo de crescimento e deve ser reconhecido, pelo pouco ou muito que tem a nos passar. Existe um velho ditado que nos diz que ninguém sabe tudo que não tenha nada a aprender, ninguém sabe nada que não tenha nada a ensinar. Tal axioma deveria ser uma norma a ser seguida por todos alunos e professores. A participação dos alunos em sala de aula é tão importante quanto o respeito do professor a suas manifestações. Em uma sala de aula onde todos tem a liberdade de perguntar ou dizerem o que pensam sobre o assunto só enriquece o conhecimento, tanto do aluno, como do professor que mesmo que saiba todas as respostas, passara a conhecer novas perguntas.

segunda-feira, junho 07, 2010

Identidade e Ação Histórica

Ao trabalhar com a busca da identidade de meus alunos deparei-me com outras questões relacionadas. A identidade vem atrelada ao conhecimento (ou falta dele), a cultura, as raízes e histórias de cada um. Para cada identidade uma individualidade, uma face de muitas faces. Um indivíduo não vive só. Ele faz parte de uma sociedade, tem laços familiares em maior ou menor grau, alguns estruturados, outros nem tanto. Uma sala de aula possui diferentes individualidades, diferenças de sexo, idade, origem, religiosidade, nível sócio-econômico e outros aspectos, alguns irrelevantes (ou não) como o time do coração. Cada um traz a sua carga de conhecimento e é com elas que procuramos trabalhar. Crianças com lares onde o computador não é nenhum bicho estranho, outras onde o livro é um dragão de sete cabeças. Cada um possui um passado e há de construir o seu futuro. Devemos conhecer quem somos de onde viemos e para onde queremos ir.

“Gosto de ser gente porque inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. A diferença entre o inacabado que não se sabe como tal e o inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado. Gosto de ser gente porque, como tal, e o inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado. Gosto de ser gente porque, como tal, percebo afinal que a construção de minha presença no mundo, que não se faz no isolamento, isenta da influencia das forças sociais, que não se compreende fora da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo social, culturalmente e historicamente, tem muito a ver comigo mesmo.
... O fato de me perceber no mundo, com o mundo e com os outros me põe numa posição em face do mundo que não é de quem nada tem a ver com ele. Afinal, minha presença no mundo não é a de quem a ele se adapta mas a de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também da história.” FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Ensinar exige respeito o reconhecimento de ser condicionado - 1996.

Se Paulo Freire, estudioso e ícone na educação mundial, considerava-se um ser inacabado, o que resta a mim e a meus alunos senão também assumirmos nossa condição humana de seres em constante formação e procurarmos aprimorar cada vez mais nossos conhecimentos.
Não somos uma individualidade pronta e acabada, que não teve origem e não sofre influências do meio. Somos todos capazes de ser “sujeitos da história”. Conhecer um pouco mais de sua própria identidade e a busca de valorizar o “eu” de cada um. De construir a nossa autonomia e inserirmo-nos no mundo, deixando nossas marcas.