quarta-feira, setembro 02, 2009

Qual é a diferença?




Fiquei muito feliz com a escolha do texto “A educação Após Auschwitz”, de Theodor Adorno, que trabalhamos em Filosofia da Educação. Um texto escrito há várias décadas, mas com uma temática atual.
Estou adorando a proposta de trabalho desta disciplina, pois estamos sempre sendo desafiados a criar argumentos sobre os textos, filmes, enfim. O filme “O Clube do Imperador” fez-me lembrar a Grécia Antiga, e parece que essa é a idéia da professora Elaine Conte. Pois lá, na Grécia Antiga, se ensinava a arte da retórica aos cidadãos de Athenas. Era através da argumentação e da dialética, em praça pública, que se exercia a democracia. Se os sofistas se especializaram na retórica, o conhecimento evoluiu de Sócrates a Platão, a filosofia tomou forma e criou a Academia. Hoje, na academia moderna, aprendemos a filosofar. Nossos argumentos devem defender nossas idéias, não mais diante dos atenienses, mas perante o mundo. Não estamos mais limitados a um grupo, presos a uma sala de aula, a internet nos coloca diante do mundo. E temos aqui a responsabilidade de dizer: Auschwitz, nunca mais! Não se trata de concordar ou discordar dos argumentos de Adorno, e sim alertar para o perigo de um novo holocausto, de uma volta à barbárie.
Hoje, na Áustria é considerado crime o nazismo ou o neonazismo, assim como manifestar-se a favor desta ideologia. Não é um tolhimento da liberdade de expressão, e sim uma regra de conduta civilizada. A Áustria está dizendo não a barbárie. Adorno nos diz que a educação é a única arma que temos contra o que aconteceu em Auschwitz. Mas qual educação está sendo dada em nossas escolas?
Há pouco tempo, procurando uma saída para as brigas que envolviam meus alunos, resolvi trabalhar com o filme “Escritores da liberdade”. Neste filme tem uma cena interessante onde os alunos visitam um museu em homenagem as vítimas do holocausto. Neste museu, há passagens onde o visitante deve optar por qual caminho seguir: homens/mulheres, adultos/crianças e a triagem não para por aí: saudáveis/doentes, judeus/negros/ciganos. A mesma separação que os nazistas faziam nos campos de concentração, para separar os que iam morrer: na câmera de gás, trabalhando ou de fome. Os caminhos do museu levavam todos ao mesmo lugar, uma sala onde o visitante poderia saber um pouco mais sobre o destino daqueles que foram para os campos de concentração. Por fim as classificações dos nazistas levavam todos ao mesmo lugar: a morte. A única diferença era somente o quando e como. Auschwitz era a grande arma tecnológica e eficiente para a “solução final”. No filme, baseado numa história real, os alunos conhecem Miep Gies, a senhora que abrigou Anne Frank e sua família, durante vinte e cinco meses em um sótão. No filme, entre um aluno e essa senhora, ocorre o seguinte diálogo:
- Eu nunca tinha conhecido um herói, a senhora é a minha heroína.
- Oh, não! Não, não, meu jovem. Não sou uma heroína, não. Eu fiz o que tinha que fazer, porque era a coisa certa a fazer, foi só isso. Nós somos, todos, pessoas comuns, mas mesmo uma simples secretária ou uma dona de casa ou adolescente, podem, mesmo que com pequenas atitudes acender uma luzinha numa sala escura. Não é?
Anne Frank e sua irmã morreram no campo de concentração de Bergen-Belsen, em março de 1945. Aqueles que forem além do “Diário de Anne Frank”, vão ler o relato dos que sobreviveram ao mesmo campo de concentração, descrevendo Anne como uma menina simpática, com um lindo sorriso. Sorriso que se apagou com a morte de sua irmã, Margot. Após a morte dela, a menina que até então parecia tão cheia de vida (apesar das duras condições a que estava submetida), definhou e morreu no decorrer de poucos dias. Seus companheiros de infortúnio não estranharam a repentina mudança, para morrer nos campos bastava não lutar pela vida.
Adorno não chegou a conhecer o fim do Apartheid, o regime racista da África do Sul, mas foi contemporâneo de seu início, assim como do terror nazista. O autor nos fala do medo de um novo Auschwitz. Não é preciso muito para ver o mesmo medo no Gueto de Soweto, a mesma desumanização que foi vista no gueto de Varsóvia.
Como deixamos isso acontecer? Adorno nos mostra que a ideologia nazista era voltada para a valorização tecnológica, a massificação cultural, o não questionamento de seus líderes e onde o indivíduo deveria ser indiferente a dor e capaz de suportá-la, sendo assim o homem era “coisificado”. Assim fica mais fácil rotulá-lo, segregá-lo e após dizimá-lo, não havendo dor, nem remorso.
E nós, como educadores e membros ativos de uma sociedade democrática o que temos feito para que não surja um novo Auschwitz? Uma barbárie tão distante de nós, quanto o Apartheid de Adorno. A barbárie anda lado a lado com a civilização, e é preciso ser vigilante para que ela não retorne. Adorno nos propõe a solução pela educação. Utilizando a leitura de nossa professora Elaine Conte de seu discurso:
“E, então, ele pronuncia uma frase que gosto muito: "se não fosse pelo meu temor em ser interpretado equivocadamente como sentimental, eu diria que para haver formação cultural se requer amor; e o defeito certamente se refere à capacidade de amar" (Adorno, 1985, p. 64). Amor, para Adorno, é manter-se aberto, com todos os poros, todos os sentidos, todos os sentimentos, para o discurso alheio, livre e de maneira plural.”
Não sei se estou apta a este amor, penso que o discurso nazista deve ter o mesmo tratamento que é dado na Áustria. Se professores e acadêmicos se calarem diante da triagem de seus alunos; bem, talvez o medo de Adorno seja mais real do que imaginamos.
Esse texto foi excluído acidentalmente e republicado!

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